Começou na quinta-feira (13), pouco antes das 10h, o júri popular – no Fórum de Olinda – de três acusados de canibalismo em Pernambuco.
Jorge Beltrão Negromonte da Silveira, Isabel Cristina Torreão Pires e Bruna Cristina Oliveira da Silva serão julgados por homicídio quadruplamente qualificado, vilipêndio (violação) e ocultação do cadáver de Jéssica Camila da Silva Pereira, 17 anos, em maio de 2008.
Eles também são acusados de duas outras mortes em Garanhuns, no Agreste do estado.
O caso ganhou repercussão em 2012, quando a polícia descobriu que o trio fatiava a carne dos corpos das vítimas, guardava na geladeira e não só consumia como utilizava para rechear coxinhas e salgadinhos que vendia em Garanhuns.
A vítima que morava em Olinda, Jéssica Pereira, era moradora de rua, tinha 17 anos e uma filha de um ano. Ela aceitou viver com os acusados, que planejavam matar a mãe e ficar com a menina.
A criança, inclusive, também teria comido da carne da mãe. Em Garanhuns, foram mortas Giselly Helena da Silva, 31 anos, e Alexandra Falcão da Silva, 20 anos, respectivamente, em fevereiro e março de 2012.
Os acusados afirmam fazer parte da seita Cartel, que visa a purificação do mundo e o controle populacional. A ingestão da carne faria parte do processo de purificação.
A promotora Elaine Gaia diz que a culpa deles é igual.
- Vou pedir condenação máxima dos três. Nós temos provas suficientes para derrubar as teses de defesa. Ninguém estava obrigado a fazer nada, todos estavam livres. Se Isabel estava sendo forçada, ela tinha liberdade suficiente para procurar as autoridades oficiais, mas ela não fez isso em momento nenhum. Eles foram submetidos a testes psiquiátricos que provam que são normais – afirmou.
A defesa de Jorge Beltrão será feita por Tereza Joacy, da Defensoria Pública, que chegou ao local pouco depois das 8h. A primeira testemunha a ser ouvida, às 10h, foi Lamartine Holanda Júnior, médico psiquiatra que analisou os três réus na época em que foram presos.
Ao ser questionado sobre a possível esquizofrenia de Jorge Beltrão, ele alegou que não o considerava esquizofrênico e não acredita que a doença existe.
- Não cabe esse rótulo no caso dele. A observação mostrava que ele sabia o que fazia, sabia as consequências, planejava – diz.
Em relação a Isabel Cristina e Bruna Cristina, o médico também alegou que elas não sofrem de distúrbios.
- Ela [Isabel] é uma pessoa comum, sabe o que diz e o que faz. Ela sabia o que estava fazendo e busca, de algum modo, desculpas para se safar – afirma.
O delegado Paulo Berenguer, responsável pelo caso na época do crime, foi o segundo a ser ouvido. Ele detalhou a relação entre os três suspeitos, como aconteceu o homicídio e o objetivo do crime, de acordo com os depoimentos dos réus.
- O objetivo era criar a criança como filha dos dois [Isabel e Jorge] e Isabel alimentou essa ideia quando viu Jéssica pedindo esmolas. A partir do desejo de criar a menina, decidiram eliminar Jéssica”, conta. Sobre a seita, denominada “o cartel” por Jorge, o delegado afirma que foi uma ficção criada para justificar o assassinato. “O homicídio foi planejado antes, durante e depois – alega.
Ao final do depoimento, a juíza questionou se o delegado percebeu arrependimento dos acusados em algum momento dos interrogatórios, o que foi negado pela testemunha. Ainda de acordo com o testemunho, os réus confessaram os crimes e contribuíram para as investigações. Após um intervalo, a sessão foi retomada à tarde com a ouvida dos réus.
O primeiro a ser ouvido foi Jorge Beltrão, acusado de desferir o golpe que matou a vítima. Ele contou como aconteceu o crime e disse estar arrependido.
- Foi um erro muito grave, monstruoso, do qual me arrependo muito. Foi um momento de extrema fraqueza e brutalidade. Eu me sinto na posição das pessoas que perderam seus entes queridos e estou arrependido não porque estou preso, mas porque minha verdadeira prisão é minha consciência – revela.
Ao final dos questionamentos da juíza, Jorge, que permaneceu o depoimento inteiro de olhos fechados, pediu para fazer uma oração. Concedida a permissão, agradeceu pela oportunidade de falar a verdade e pediu consolo para as famílias das vítimas.
O acusado também disse que tem problemas de depressão e revelou ter “apagões” quando não tomava os remédios controlados.
- Quando não tomo, não consigo dormir, não consigo pensar direito e, quando não consigo pensar direito, fico parado. Às vezes, me vem um apagão e eu não me lembro das coisas que aconteceram. Meus colegas de cela ficam agoniados quando isso acontece, porque dizem que fico muito nervoso e agitado – afirma.
Terminada a fase de ouvidas, têm início os debates, que podem durar até nove horas. Ao fim dessa etapa, os jurados recolhem-se, em sala reservada, para responder aos questionamentos que definirão se os réus serão condenados ou absolvidos. Por último, a magistrada retorna ao salão do júri para prolatar a sentença.
A juíza Maria Segunda Gomes de Lima, titular da 1ª Vara do Tribunal do Júri de Olinda, preside a sessão e prevê que o julgamento acabe ainda nesta quinta.
- É complexo porque envolve vários advogados e réus, mas é um julgamento como qualquer outro. O que vai acontecer é que as provas do processo vão ser analisadas pelas partes, tanto pela defesa quanto pelo Ministério Público – explicou.
Paulo Sales, advogado de Isabel Cristina, alega que ela foi obrigada a participar do crime.
- A participação era forçada e isso exclui o caráter ilícito. Ela tem que ter conhecimento da ilicitude. Foi uma obrigação de terceiro, esse terceiro teria forçado. Ela tem distúrbios mentais, mas não a ponto de ser insana”, disse. Ele vai pedir inocência por coação moral irresistível e resistível. A irresistível exclui a culpa e a resistível reduz a pena – afirma.
DO G1, COM EDIÇÃO DO GI PORTAL
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