A 1ª Vara Criminal da Comarca da Ilha condenou o empresário Josival Cavalcante da Silva, conhecido como Pacovan e mais 21 réus denunciados pelo Ministério Público estadual por crimes contra a ordem tributária, lavagem de dinheiro e formação de organização criminosa, que seriam praticados por meio de postos de gasolina em São Luís e no interior do Estado, da rede Nosso Posto.
A sentença do juiz Ronaldo Maciel, titular da vara exclusiva de processamento e julgamento dos crimes de organização criminosa, com mais de 500 páginas, foi emitida na véspera do recesso judiciário, em 18 de dezembro, e acolheu, parcialmente, os pedidos do Ministério Público estadual de condenação dos 22 réus e reparação dos danos causados por suas condutas ilícitas e perda de bens e valores envolvidos nos crimes.
No julgamento do caso, o juiz constatou a existência dos elementos que configuram o crime de organização criminosa regulamentado na Lei nº 12.850/2013 (Define organização criminosa e dispõe sobre a investigação criminal, os meios de obtenção da prova, infrações penais correlatas e o procedimento criminal a ser aplicado), identificando os requisitos de “estrutura ordenada, divisão de tarefas, estabilidade e permanência” das práticas delituosas atribuídas ao grupo.
Josival Cavalcante da Silva, o Pacovan, identificado como líder do grupo, foi condenado a dez anos, oito meses e 15 dias de reclusão. Edna Maria Pereira (ex-companheira de Pacovan) e José Etelmar Carvalho Campelo (contador) foram condenados a oito anos e três meses de reclusão. Geraldo Valdônio Lima da Silva (o Mamãe), Francisco Xavier Serra Silva, Jean Paulo Carvalho Oliveira e Thamerson Damasceno Fontinele receberam oito anos de reclusão e sete meses de detenção.
Simone Silva Lima (Empresa “Serra Caminhões) e Renato Lisboa Campos (ex-prefeito de Bacabal) foram condenados a oito anos de reclusão, e um ano de detenção. Também foram punidos com oito anos de reclusão os demais réus Rafaely de Jesus Souza Carvalho, Júnior de Andrade Silva, João Batista Pereira (o JB), Lourenço Bastos da Silva Neto (contador), Sâmia Lima Awad, Kellia Fernanda de Sousa Duailib, Manassés Martins de Sousa (o Bob). Receberam a mesma pena Ilzenir, Creudilene e Creudiane Souza Carvalho, Auriléia de Jesus Froz Moraes, Manuel Santos da Silva e Adriano Almeida Sotero – considerados “laranjas” no esquema.
A investigação
As investigações tiveram início em 2015 e demonstram a existência de movimentações atípicas praticadas pela organização criminosa desde o ano de 2012. Interceptações telefônicas realizadas até 2017 apontaram a existência das condutas praticadas pelos integrantes do grupo.
Foram esclarecidos, na ação penal, o funcionamento de esquema de agiotagem e o “modus operandi” da organização criminosa, com recrutamento de pessoas para a constituição de empresas individuais ou em sociedade; branqueamento de capitais de origem ilícita por meio de uma atividade lícita (empresas de revenda de combustível, material de construção e veículos) que movimentam vultosas quantias de origem ilegal; revenda de mercadorias não declaradas ao fisco (sonegação fiscal) e atividades paralelas criminosas, como a prática de usura, com envolvimento de políticos ou candidatos a cargo eletivos.
O esquema contava com a atuação de profissionais de contabilidade voltada à constituição de empresas em nome de “laranjas”, que detinham o controle e o conhecimento das irregularidades financeiras realizadas nas empresas.
A denúncia
Segundo o Ministério Público, a empresa Nosso Posto Joyce II, constituída em 2014, com capital de 100 mil reais, administrada por Pacovan e formalmente de propriedade dos denunciados Rafaely Carvalho e Júnior de Andrade Silva, registrou entre maio e dezembro de 2014, movimentação financeira típica, acima de sua capacidade financeira, com aplicações de R$ 11.558.000 e faturamento de R$ 8.715.952,26, demonstrando a prática de crimes contra a ordem tributária associado ao branqueamento de capitais.
Consta, ainda, que a empresa participa dos grupos empresariais Gasóleos Santa Teresinha e Comércio de Derivados de Petróleo Joyce, os quais tiveram faturamento, no mesmo período, de R$ 3.672.585,18 e R$ 19.880.208, demonstrando inconsistência entre o fluxo regular de valores da referida atividade comercial – venda de combustível e derivados, com distorções de valores transitados e registrados nas contas bancárias da empresa.
Ainda de acordo com a denúncia, houve um fluxo intenso de valores em curto espaço de tempo, além de recebimento de recursos de diversas prefeituras do Maranhão, como Nova Olinda, Bela Vista, Pio XII, Afonso Cunha, Santa Rita, Serrano do Maranhão, Água Doce e Magalhães de Almeida. Além disso, ficou demonstrada a existência de transferência de dinheiro pela empresa a pessoas físicas ligadas a prefeituras, como prefeitos, secretários e servidores em geral.
A denúncia também aponta inconsistências em relação a pessoas jurídicas identificadas nas movimentações financeiras mantidas com o Nosso Posto Joyce II, que comprovam o cometimento de crimes de lavagem de dinheiro, como as empresas BFX Construções e Comércio, PG Mineração e Engenharia, CS Oliveira e Comércio-ME e Lastro Engenharia e Incorporações.
As provas da materialidade e da autoria foram sustentadas em um conjunto de provas com informações do sistema Infoseg, declarações prestadas na investigação policial, registros de ocorrências, laudo de perícia criminal, interceptações telefônicas, interrogatórios de acusados e declaração de testemunhas em juízo, relatório de análise fiscal e de levantamento de imóveis, dentre outros documentos.
A sentença
Na sentença, o juiz constata que o “modus operandi” empregado pelos denunciados revelou a existência de “uma forte organização criminosa, estável e permanente”, e a “estreita ligação entre seus integrantes com a finalidade de cometer diversos crimes, como lavagem de dinheiro, usura, crime tributário, e crimes contra a ordem econômica”.
Cada um dos integrantes do grupo criminoso exercia atividades específicas, de acordo com suas habilidades e aproveitamento, conforme as funções que exerciam nas respectivas empresas às quais estavam ligadas, pertencentes ao grupo liderado por Pacovan, cooperando para o todo criminoso.
“... A organização criminosa, em sua atuação, tinha como principal objetivo a obtenção de vantagem de qualquer natureza, tais como dinheiro, imóveis, gados, veículos, dentre outros”, declarou o juiz na sentença.
Ronaldo Maciel esclareceu que, embora havendo “necessidade e urgência”, deixou de decretar a prisão preventiva de Pacovan para impedir a continuidade das condutas criminosas, por falta de requerimento do Ministério Público, nas alegações finais da ação. O juiz explicou que a falta do pedido não se deve à inércia do MP, mas pelo fato de a prisão do empresário, por crimes semelhantes (pela Polícia Federal, em 3/12/20) ter ocorrido somente depois da conclusão do processo para sentença, e, embora existindo o fato novo (a prisão dele) – o que justificaria a decretação, por ser fato público e notório, mesmo não existindo nos autos - deixou de decretar a prisão de Pacovan devido ao impedimento de natureza processual.
O Código de Processo Penal, com as alterações realizadas pelo pacote anticrime (Lei 13.964/2019), passou a exigir, em seu Artigo 311, o requerimento do Ministério Público ou representação da autoridade policial, mesmo na fase judicial, impedindo a decretação de prisão de ofício pelo magistrado.
Quanto aos demais réus, que se encontram respondendo à ação penal em liberdade, o juiz também não viu motivos para a decretação da prisão preventiva na sentença condenatória, porque essa ordem decorreria apenas da fase processual, o que configuraria prisão decorrente de sentença condenatória recorrível, já eliminada do ordenamento jurídico.
Com relação aos bens sequestrados/apreendidos, inclusive os veículos que se encontram na posse dos acusados, o juiz decretou o perdimento desses bens e, após o trânsito em julgado da sentença, que sejam entregues no depositário público do Estado, para que sejam avaliados e vendidos em hasta pública.
O juiz determinou, ainda, o envio de cópia da sentença à Agência Nacional do Petróleo (ANP), órgão regulador das atividades que integram as indústrias de petróleo e responsável pela fiscalização das empresas concessionárias de venda de petróleo.
(Informações do TJ-MA)
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